Rio e arroios nos enriquecem.
A poluição deles nos ameaça

Rio e arroios nos enriquecem. A poluição deles nos ameaça

Poucas cidades têm o que Lajeado possui. Um rio majestoso e vários outros arroios que compõem uma farta riqueza hídrica. Símbolo da colonização, o Taquari é relegado em termos de aproveitamento, ainda que aos poucos surjam iniciativas que alimentam esperança. Fatalmente, o rio é atingido pela falta de política pública voltada ao saneamento básico, capaz de evitar que o esgoto continue empurrado para as águas.

O Rio Taquari agoniza devido à falta de tratamento do esgoto. Classificado na categoria 4 pelo Comitê da Bacia Hidrográfica Taquari\Antas. Significa que a água está contaminada, desaconselhado para banho, para uso no cultivo de hortaliças e mesmo para a pesca. O rio é símbolo da colonização de todo o Vale do Taquari, conta o professor e coordenador do Curso de História EAD da Univates, Mateus Dalmaz. “Em um primeiro momento, a ocupação deste território era de populações indígenas e se encerra no fim do século XIX, com a chegada de imigrantes europeus”, detalha.

De acordo com ele, neste período era fundamental o aproveitamento de recursos naturais, especialmente a água. “Desde a chegada das populações indígenas até o estabelecimento Rio Taquari é um dos símbolos de Lajeado. Foi o principal recurso natural para o desenvolvimento dos primeiros povoados dos imigrantes europeus, o Vale do Taquari em geral e Lajeado em particular se caracterizaram por condições socioeconômicas derivadas do aproveitamento de recursos naturais, especialmente do Rio Taquari.”

Dalmaz frisa que no momento da oficialização de Lajeado como cidade, em 1891, a urbanização se desenvolvia em torno dos núcleos portuário e comercial. “A construção de rodovias nas décadas seguintes, contudo, levaria o município a outros contornos. ”

Esgoto como calcanhar de aquiles

Com a urbanização regional e mais acelerada em Lajeado, ficou evidente o lapso na sustentabilidade. Quatro aspectos sustentam o conceito de saneamento básico. Abastecimento de água, drenagem das ruas, coleta de lixo e esgoto. De todas elas, Lajeado tem como gargalo a receptação e tratamento dos efluentes domésticos.

O Vale do Taquari tem um índice de tratamento de esgoto menor do que a média estadual. Enquanto no RS, se estima que 32% dos efluentes passe por algum processo de limpeza, na região, conforme tabulação do Codevat, esse percentual alcançaria 11%.

Como principal esperança de ampliar esse percentual, após décadas de ausência das políticas públicas para criar um sistema capaz de reduzir a poluição dos mananciais, foi aprovado o novo marco legal do saneamento básico. Entre as metas do texto está alcançar 90% do esgoto tratado até 2033.

Para o professor e pesquisador da Univates, Odorico Konrad, pelo histórico nacional, é uma meta difícil de ser atingida. “É preciso olhar os contratos. Lajeado, tem acordo com a Corsan para os próximos 20 anos. A lei não sobrepõe o que foi assinado antes”, alerta.

Índices de tratamento dos efluentes são distintos entre instituições de pesquisa e órgãos públicos. Conforme IBGE, RS trata 86% do esgoto.

Parece um índice alto, mas essa avaliação considera também as residências com fossa, filtro e sumidouro. Um sistema falho, em especial nas áreas urbanas e de grande densidade demográfica, pois precisa de limpeza periódica, a cada seis meses, o que não costuma acontecer.

O dado mais real, apontado pelo Codevat, também é dúbio, avalia Konrad. Para ele, esses números não condizem com a realidade. “Não chegamos a 5%. Há uma estação em Lajeado, que tem problemas para coleta no bairro Moinhos. Também há condomínios, loteamentos com sistemas próprios. Mas isso não alcança 11%”, contrapõe.

A Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA) estuda um plano de investimentos no Vale do Taquari via Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES). Modelo semelhante ao que está em andamento para a bacia do rio dos Sinos e Gravataí.

O novo marco regulatório de saneamento básico cria a possibilidade de parcerias público-privadas para investimentos, projetos e concessões nas quatro áreas.

Mau cheiro e contaminação

Diante desse índice baixo de tratamento dos efluentes, o Vale do Taquari tem uma das bacias hidrográficas mais poluídas do RS. Conforme Konrad, ainda que o modelo previsto pela legislação das cidades, de fossa, filtro e sumidouro esteja presente em 90% das residências, a falta de manutenção faz com que o material orgânico, depois de encher os recipientes, se espalhem pelo solo.

Como consequência, invadem o lençol freático, poluindo águas profundas. Outra dificuldade é a ligação do esgoto das casas direto na rede pluvial. Os resultados dessas duas práticas são o mau cheiro nas ruas, a contaminação de arroios, córregos e rios. Em períodos de estiagem, a situação fica mais visível.

Os materiais orgânicos se acumulam nos trechos onde corria água. Levantamento do Comitê da Bacia Hidrográfica Taquari/Antas mostra que das 32 sub-bacias, os níveis de oxigênio são baixos, com alta taxa de contaminação por coliformes fecais e fósforo.

Investimento milionário e resultado pífio

A Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) do bairro Moinhos começou a ser construída em 2011. Um investimento próximo dos R$ 2 milhões. Conforme o gerente da Corsan de Lajeado, Alexander Pacico, a estação trata os efluentes de 340 residências do bairro. O complexo foi projetado para operar com oito litros de esgoto por segundo e tem capacidade para atender mil economias.

De acordo com Pacico, a implantação de um sistema de tratamento de esgoto em Lajeado é uma obra complexa, pelo impacto na mobilidade urbana e também devido ao solo rochoso da cidade. “Os novos loteamentos têm a previsão de um sistema de esgoto, porém a cidade como um todo foi concebida sem este sistema, disso decorre o grande desafio de implantação, pois teremos de romper as vias para a canalização.”

A Corsan pretende ampliar o número de residências ligadas na ETE neste ano. O gerente afirma que moradores do bairro Florestal serão informados sobre a possibilidade de ligarem a tubulação do esgoto na estação. O plano é incrementar em 500 residências o total de hoje.

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